Quando se trata de histórias sobre o "próximo papa", nada mais sexy, do ponto de vista da mídia, do que a ideia de um "Papa negro", referindo-se, neste caso, não ao chefe da ordem Jesuíta (tradicionalmente apelidado de "papa negro," ostensivamente por causa da batina preta que o Superior Geral usa, mas também como uma referência depreciativa às alegadas intrigas jesuítas), mas um pontífice da África.
A reportagem é de John Alen Jr, publicada no blog do portal New Catholic Reporter, 19-02-2013. A tradução é deSilvia Ferabolli.
A nível simbólico, a ideia de uma instituição que é tradicionalmente vista como a última das instituições de Primeiro Mundo ser liderada por um homem negro do hemisfério sul tem uma magia inegável.
Entre os 117 cardeais que logo irão se reunir na Capela Sistina para eleger o sucessor de Bento XVI, o nome do Cardeal Peter Turkson, de Gana, é proeminente na lista de possíveis candidatos africanos.
Na verdade, o próprio Turkson não tem se mostrado tímido no que tange ao abraçar essa possibilidade. Em entrevista recente ao Telegraph britânico, Turkson especulou abertamente sobre o significado de ele vir a tornar-se Papa (naquilo que pode ser considerado o eufemismo do ano, Turkson afirmou que tal acontecimento “sinalizaria uma grande mudança [pessoal].")
Peter Kodow Appiah Turkson, 64, nasceu em Gana ocidental de uma mãe metodista e um padre católico, um fato biográfico que cita frequentemente para explicar seu interesse no ecumenismo. Ele estudou no St. Anthony-on-Hudson Seminary, em Nova York, antes de ele ser fechado, em 1989. Também estudou na prestigiada Pontifical Biblical Institute, em Roma. Tornou-se arcebispo de Cape Coast em Gana, em 1992, e passou a servir como presidente da conferência episcopal nacional e a desempenhar um papel ativo no SECAM, o Simpósio das Conferências Episcopais da África e Madagascar.
Em 2009, Bento XVI apontou Turkson como relator, ou secretário-geral, de um sínodo dos Bispos na África, que teve um mês de duração. No final do evento, ele não precisou arrumar as malas para voltar para casa, porque o Vaticano anunciou a nomeação de Turkson como Presidente do Pontifício Conselho Justiça e Paz, ainda no final do sínodo.
Turkson é geralmente visto como uma pessoa afável e aberta, com um senso de humor vibrante e franqueza encantadora, não dado a banalidades diplomáticas piegas. Em toda a África, ele é visto como um dos mais dinâmicos líderes da igreja no continente. Não coincidentemente, a sede da SECAM é em Gana, refletindo o papel de liderança que os ganeses mantêm há muito tempo em assuntos católicos africanos.
Os argumentos a favor de Turkson baseiam-se em vários pontos:
Primeiro, muitos cardeais querem um Papa com profunda experiência pastoral em uma diocese; outros estão procurando alguém que conheça o Vaticano e que possa manter o lugar sob controle. Na medida em que o currículo do Turkson estampa ambas experiências, ele poderia satisfazer ambos os desejos.
Em segundo lugar, e pelo menos em nível abstrato, alguns Cardeais consideram atraente a ideia de mostrar um rosto não-Ocidental para o crescente campo católico fora do Ocidente, e Turkson certamente faria isso num piscar de olhos.
Em terceiro lugar, Turkson assumiria seu posto sem qualquer bagagem oriunda dos recentes escândalos que afligem o Vaticano. Seu nome não está ligado a bagunça dos Vatileaks e ele não teve nada a ver com o banco do Vaticano. Além disso, não há qualquer registro de que ele estivesse envolvido em quaisquer dos casos relacionados a crise de abuso sexual clerical. (Quando a SNAP, o principal grupo de vítimas, recentemente emitiu uma avaliação dos candidatos papais, Turkson estava entre aqueles que o grupo afirmou não ter informações suficientes para julgar).
Em quarto lugar, pra uma igreja empenhada em uma «nova evangelização», Turkson seria um líder enérgico, atraente e até mesmo capaz de seduzir as pessoas em direção a um novo olhar sobre a Igreja católica.
Quinto, ele reflete uma ética africana muito tradicional em matéria de moralidade sexual e família, o que significa que a eleição de Turkson não ameaçaria os cardeais mais preocupados com o reforço de uma postura pró-vida da Igreja. Um perfil recente de Turkson no Independente o pelidou de “Cruzado do Conservadorismo de Cape” exatamente por esse motivo.
Em sexto lugar, as relações com o Islã certamente está no topo da lista de afazeres do próximo Papa, e Turkson tem experiência pessoal nisso, uma vez que seu tio paterno é um muçulmano. Em Gana, Turkson viveu no meio de muçulmanos e tem sido um líder nas relações católico-islâmicas em toda a África. Contudo, ele pode ser bastante firme em suas posições, tendo uma linha forte sobre a necessidade de sociedades muçulmanas respeitaram a liberdade religiosa.
Os pontos negativos de Turkson incluem os seguintes:
Em primeiro lugar, o Conselho Justiça e Paz não é percebido como um dos departamentos peso-pesado do Vaticano, o que faz com que alguns grupos duvidem que sua carreira tenha lhe dado a preparação necessária para o salto quântico rumo ao papado. Além disso, amigos do Turkson diziam em 2009 que ele realmente preferia retornar aGana, em vez de servir em Roma, o que pode levar alguns a questionar se ele está pronto para o muito mais exigente espectáculo Romano.
Em segundo lugar, alguns conservadores consideram Turkson um tanto centro-esquerda demais, especialmente em matéria de justiça econômica. Em 2011, seu conselho emitiu um documento intitulado Rumo a Reforma dos Sistemas Financeiros e Monetários Internacionais no Contexto da Autoridade Política Global, o qual expressa uma clara rejeição das políticas econômicas “neoliberais” (ou “neo-conservative”, no jargão americano) além de fazer um claro endosso a uma "verdadeira autoridade política mundial” que regule a economia globalizada. Críticos consternados pelo teor da nota desafiaram sua posição no Vaticano. George Weigel desdenhou o documento, descrevendo-o como produto de um "pequeno escritório da Cúria Romana" enquanto Bill Donohue disse que esse contém "neologismos" não encontrados no pensamento do Papa Bento XVI.
Em terceiro lugar, alguns se perguntam se Turkson está realmente pronto para o horário nobre. Durante o sínodo do outono passado sobre a Nova Evangelização, Turkson fez uso do tempo de uma das reuniões para mostrar um vídeo alarmista do Youtube sobre o Islã, que continha estatísticas sensacionalistas sobre a imigração muçulmana na Europa que já haviam sido completamente desacreditadas. A reação negativa dentro do sínodo foi tamanha que outros Bispos sentiram-se compelidos a se levantar e a pedir que ele parasse com as criticas. Embora Turkson tenha rapidamente se desculpado, ele deixou dúvidas remanescentes em alguns dos presentes sobre sua capacidade de discernimento.
Em quarto lugar, o comentário aberto de Turkson sobre a conveniência de um Papa africano, chegando até mesmo a flertar com a ideia de ser ele mesmo o próximo Papa, gerou desconforto entre aqueles que acreditam que ele esta fazendo campanha para assumir o posto. Amigos insistem que essas atitudes simplesmente reflectem o caráter honesto e de “cara legal” de Turkson, que não quer dizer "não" aos jornalistas que necessitam de comentários e também não quer ser evasivo em suas respostas.
No entanto, em um processo eleitoral onde colocar-se no centro das atenções é frequentemente desaprovado, ser um cara legal pode ter seu preço.
A reportagem é de John Alen Jr, publicada no blog do portal New Catholic Reporter, 19-02-2013. A tradução é deSilvia Ferabolli.
A nível simbólico, a ideia de uma instituição que é tradicionalmente vista como a última das instituições de Primeiro Mundo ser liderada por um homem negro do hemisfério sul tem uma magia inegável.
Entre os 117 cardeais que logo irão se reunir na Capela Sistina para eleger o sucessor de Bento XVI, o nome do Cardeal Peter Turkson, de Gana, é proeminente na lista de possíveis candidatos africanos.
Na verdade, o próprio Turkson não tem se mostrado tímido no que tange ao abraçar essa possibilidade. Em entrevista recente ao Telegraph britânico, Turkson especulou abertamente sobre o significado de ele vir a tornar-se Papa (naquilo que pode ser considerado o eufemismo do ano, Turkson afirmou que tal acontecimento “sinalizaria uma grande mudança [pessoal].")
Peter Kodow Appiah Turkson, 64, nasceu em Gana ocidental de uma mãe metodista e um padre católico, um fato biográfico que cita frequentemente para explicar seu interesse no ecumenismo. Ele estudou no St. Anthony-on-Hudson Seminary, em Nova York, antes de ele ser fechado, em 1989. Também estudou na prestigiada Pontifical Biblical Institute, em Roma. Tornou-se arcebispo de Cape Coast em Gana, em 1992, e passou a servir como presidente da conferência episcopal nacional e a desempenhar um papel ativo no SECAM, o Simpósio das Conferências Episcopais da África e Madagascar.
Em 2009, Bento XVI apontou Turkson como relator, ou secretário-geral, de um sínodo dos Bispos na África, que teve um mês de duração. No final do evento, ele não precisou arrumar as malas para voltar para casa, porque o Vaticano anunciou a nomeação de Turkson como Presidente do Pontifício Conselho Justiça e Paz, ainda no final do sínodo.
Turkson é geralmente visto como uma pessoa afável e aberta, com um senso de humor vibrante e franqueza encantadora, não dado a banalidades diplomáticas piegas. Em toda a África, ele é visto como um dos mais dinâmicos líderes da igreja no continente. Não coincidentemente, a sede da SECAM é em Gana, refletindo o papel de liderança que os ganeses mantêm há muito tempo em assuntos católicos africanos.
Os argumentos a favor de Turkson baseiam-se em vários pontos:
Primeiro, muitos cardeais querem um Papa com profunda experiência pastoral em uma diocese; outros estão procurando alguém que conheça o Vaticano e que possa manter o lugar sob controle. Na medida em que o currículo do Turkson estampa ambas experiências, ele poderia satisfazer ambos os desejos.
Em segundo lugar, e pelo menos em nível abstrato, alguns Cardeais consideram atraente a ideia de mostrar um rosto não-Ocidental para o crescente campo católico fora do Ocidente, e Turkson certamente faria isso num piscar de olhos.
Em terceiro lugar, Turkson assumiria seu posto sem qualquer bagagem oriunda dos recentes escândalos que afligem o Vaticano. Seu nome não está ligado a bagunça dos Vatileaks e ele não teve nada a ver com o banco do Vaticano. Além disso, não há qualquer registro de que ele estivesse envolvido em quaisquer dos casos relacionados a crise de abuso sexual clerical. (Quando a SNAP, o principal grupo de vítimas, recentemente emitiu uma avaliação dos candidatos papais, Turkson estava entre aqueles que o grupo afirmou não ter informações suficientes para julgar).
Em quarto lugar, pra uma igreja empenhada em uma «nova evangelização», Turkson seria um líder enérgico, atraente e até mesmo capaz de seduzir as pessoas em direção a um novo olhar sobre a Igreja católica.
Quinto, ele reflete uma ética africana muito tradicional em matéria de moralidade sexual e família, o que significa que a eleição de Turkson não ameaçaria os cardeais mais preocupados com o reforço de uma postura pró-vida da Igreja. Um perfil recente de Turkson no Independente o pelidou de “Cruzado do Conservadorismo de Cape” exatamente por esse motivo.
Em sexto lugar, as relações com o Islã certamente está no topo da lista de afazeres do próximo Papa, e Turkson tem experiência pessoal nisso, uma vez que seu tio paterno é um muçulmano. Em Gana, Turkson viveu no meio de muçulmanos e tem sido um líder nas relações católico-islâmicas em toda a África. Contudo, ele pode ser bastante firme em suas posições, tendo uma linha forte sobre a necessidade de sociedades muçulmanas respeitaram a liberdade religiosa.
Os pontos negativos de Turkson incluem os seguintes:
Em primeiro lugar, o Conselho Justiça e Paz não é percebido como um dos departamentos peso-pesado do Vaticano, o que faz com que alguns grupos duvidem que sua carreira tenha lhe dado a preparação necessária para o salto quântico rumo ao papado. Além disso, amigos do Turkson diziam em 2009 que ele realmente preferia retornar aGana, em vez de servir em Roma, o que pode levar alguns a questionar se ele está pronto para o muito mais exigente espectáculo Romano.
Em segundo lugar, alguns conservadores consideram Turkson um tanto centro-esquerda demais, especialmente em matéria de justiça econômica. Em 2011, seu conselho emitiu um documento intitulado Rumo a Reforma dos Sistemas Financeiros e Monetários Internacionais no Contexto da Autoridade Política Global, o qual expressa uma clara rejeição das políticas econômicas “neoliberais” (ou “neo-conservative”, no jargão americano) além de fazer um claro endosso a uma "verdadeira autoridade política mundial” que regule a economia globalizada. Críticos consternados pelo teor da nota desafiaram sua posição no Vaticano. George Weigel desdenhou o documento, descrevendo-o como produto de um "pequeno escritório da Cúria Romana" enquanto Bill Donohue disse que esse contém "neologismos" não encontrados no pensamento do Papa Bento XVI.
Em terceiro lugar, alguns se perguntam se Turkson está realmente pronto para o horário nobre. Durante o sínodo do outono passado sobre a Nova Evangelização, Turkson fez uso do tempo de uma das reuniões para mostrar um vídeo alarmista do Youtube sobre o Islã, que continha estatísticas sensacionalistas sobre a imigração muçulmana na Europa que já haviam sido completamente desacreditadas. A reação negativa dentro do sínodo foi tamanha que outros Bispos sentiram-se compelidos a se levantar e a pedir que ele parasse com as criticas. Embora Turkson tenha rapidamente se desculpado, ele deixou dúvidas remanescentes em alguns dos presentes sobre sua capacidade de discernimento.
Em quarto lugar, o comentário aberto de Turkson sobre a conveniência de um Papa africano, chegando até mesmo a flertar com a ideia de ser ele mesmo o próximo Papa, gerou desconforto entre aqueles que acreditam que ele esta fazendo campanha para assumir o posto. Amigos insistem que essas atitudes simplesmente reflectem o caráter honesto e de “cara legal” de Turkson, que não quer dizer "não" aos jornalistas que necessitam de comentários e também não quer ser evasivo em suas respostas.
No entanto, em um processo eleitoral onde colocar-se no centro das atenções é frequentemente desaprovado, ser um cara legal pode ter seu preço.
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