Professor, seja bem-vindo
No início do ano letivo, estabelecer uma rotina de colaboração e entrosamento é fundamental para adaptar e integrar tanto alunos como professores novos
Priscila Pastre (novaescola@atleitor.com.br)
No início do ano letivo, estabelecer uma rotina de colaboração e entrosamento é fundamental para adaptar e integrar tanto alunos como professores novos
Para muita gente, criar uma dinâmica divertida é a primeira idéia que vem à cabeça. Mas ela não é suficiente para garantir esse bom aproveitamento o ano todo. Não adianta enfeitar a escola se os funcionários não estiverem bem preparados para receber os estudantes, nem propor atividades de grupo sem avaliar anteriormente se alguém pode se constranger por ficar em evidência. O que vale mesmo é planejar situações que promovam o entrosamento e o desenvolvimento permanentes, não apenas no primeiro dia.
Poucas coisas são tão difíceis quanto se sentir um peixe fora d'água. Imagine o que significa o primeiro dia de aula para uma criança que acaba de chegar a uma escola nova e encontra velhos amigos se revendo e matando as saudades - e ela sem saber sequer onde é o banheiro. Para os adultos, a situação é igualmente delicada. Um professor novo encontra uma equipe estabelecida, com rotina própria e procedimentos que ele desconhece. O fato é que geralmente ele tem uma bagagem, uma experiência que precisa ser aproveitada pelo grupo.
O sociólogo suíço Philippe Perrenoud em seu livro A Prática Reflexiva no Ofício de Professor: Profissionalização e Razão Pedagógica, aponta competências básicas que ganham ainda mais relevância no início do ano: saber cooperar e trabalhar em rede, conceber a escola como uma comunidade educativa e aprender a se sentir um membro efetivo da equipe. Se você domina esses conceitos, já tem meio caminho andado para compreender as necessidades desse momento inicial e, assim, certamente vai ajudar a somar, em vez de dividir o grupo. "É na hora da passagem das turmas para o próximo professor que ficam evidentes esses conceitos", completa Marília Costa Dias, coordenadora pedagógica da Escola Projeto Vida, em São Paulo. Mais que entregar um relatório sobre o desempenho dos alunos, o ideal é conversar muito com o novo professor, apontando o desenvolvimento de cada criança, onde estão as dificuldades, qual o perfil da turma, quais foram os projetos desenvolvidos em anos anteriores.
Professor novo, nova equipe
"A postura aberta é imprescindível para que os novatos se sintam aceitos pessoal e profissionalmente", diz Raquel Volpato Serbino, professora de Pedagogia da Universidade Estadual Paulista e diretora da GAL Consultoria em Educação, em Botucatu, no interior de São Paulo. O ideal é que todos tenham a oportunidade de se apresentar aos outros e trocar experiências antes mesmo de as aulas começarem. Na EE Professor Magalhães Drummond, localizada num dos bairros mais violentos de Belo Horizonte, a postura aberta da comunidade escolar era pouco para receber os novos membros. "Por causa da fama negativa da escola, muitos professores chegavam com preconceito e medo", conta a coordenadora pedagógica Almerinda Alexandrina Damásio. No caso dos recém-chegados, a coordenadora fica atenta para os conceitos sobre coletividade, prática reflexiva, diversidade e superação dos limites - ou seja, atitudes, hábitos, métodos e posturas. As primeiras semanas do ano letivo são dedicadas a ampliar esses saberes.
Colaboração durante todo o ano letivo
No Colégio Renovação, em São Paulo, a aproximação dos professores novos e antigos se dá durante um café da manhã especial. Quem chega para o primeiro dia de trabalho encontra sobre a mesa, montada no auditório, um envelope com seu nome. Ao abrir, recebe uma mensagem de boas-vindas e uma missão bem simples, como servir outro funcionário. A idéia é transformar o primeiro contato num momento divertido e descontraído.
Durante o ano, a colaboração é sempre incentivada. Algumas reuniões são marcadas para que professores de uma mesma disciplina façam seminários e apresentações sobre os assuntos que dominam para os colegas de outras matérias - uma forma de mantê-los atualizados, melhorando seu desempenho em sala de aula e estimulando a troca de experiências. "Percebi desde o primeiro dia que a escola tratava os professores como uma equipe. E fiquei feliz por saber que estava começando a fazer parte dela", lembra a professora Patrícia Carla Souza, que estreou no Renovação em janeiro de 2006.
Acompanhamento profissional: um café-da-manhã é só o ponto de partida para uma troca de experiências entre professores do Renovação
Para Marília Costa Dias, iniciativas como essa, que colocam os estudantes como protagonistas, são uma ótima solução para uma cena triste e muito comum no início do ano: criança chorando na porta, o pai angustiado insistindo para o filho entrar e o professor aflito. Na Projeto, esse projeto de tutoria existe há quatro anos e Marília nunca mais viu esta situação. Ficou estabelecido que o primeiro dia de aula é para os alunos antigos. Assim eles podem matar as saudades à vontade. No segundo dia, entram os novos - e todas as atenções se voltam para eles.
Abaixo o apelido
Com alunos adolescentes, dinâmicas e recreação não funcionam. Passar uma lista de condutas da escola, por exemplo, é um desastre. O melhor caminho é estabelecer acordos e construir regras em conjunto. Na EMEF Paulo Nogueira Filho, em São Paulo, a primeira delas é não colocar apelidos. A medida é aprovada por Aramis Lopes Neto, membro da Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção à Infância e à Adolescência. "É nos contatos iniciais que surgem os apelidos. E isso deve ser encarado como uma forma de agressão que a escola não pode permitir."Antes vista como comportamento normal ou "típico da idade", a agressão física ou moral entre os jovens agora é tema de pesquisa e preocupação. Quando feita de forma intencional e repetitiva, essa atitude recebe o nome de bullying. "Orientamos os professores a não colocar apelidos uns nos outros e muito menos rotular turmas, como a sala dos bagunceiros, a dos espertos etc.", observa a diretora, Maria Lucia Carramão. Mesmo com o "contrato verbal" firmado no primeiro dia, a aluna Jaqueline Ferreira da Silva, 16 anos, que cursou a 8ª série no ano passado, enfrentou esse problema. Por causa do sotaque nordestino, ela virou a Baiana. "Eu não gostava porque eles ridicularizavam a origem da minha família", conta.
Os criadores do apelido não foram chamados à diretoria nem suspensos. Em vez disso, a professora de Português Magali Galvão de Almeida levou à sala de aula um texto sobre bullying e leu para a turma. O assunto foi discutido em grupo. "Perguntei a origem da família de cada um, mostrando todas as coisas boas de cada região." Deu certo. Jaqueline concluiu que não se importava mais com a brincadeira. "Depois que deixei claro que passaria a encará-la como um elogio às minhas raízes, o pessoal passou a me chamar de Jaque."
Uma pesquisa realizada em 11 colégios do Rio de Janeiro (nove da rede municipal e dois particulares) revelou que, dos 5,5 mil alunos do Ensino Médio entrevistados, 40% são ou já foram vítimas de bullying, mas não contaram a ninguém por medo ou vergonha. Outros 60% afirmaram que o local de maior incidência do fenômeno é a sala de aula. Depois de um trabalho de conscientização, que durou um ano, foi constatada uma redução de 30% no número de casos nessas escolas.
Quer saber mais?
CONTATO
Colégio Renovação, R. Kalil Nader Habr, 137, 04154-030, São Paulo, SP, tel. (11) 5073-1455
EE Professor Magalhães Drummond, R. Fernando Alves, 260, 30516-080, Belo Horizonte, MG, tel. (31) 3312-1119
EMEF Paulo Nogueira Filho, R. Brazelisa Alves de Carvalho, 356, 2510- 030, São Paulo, SP, tel. (11) 3857-1892
Escola Projeto Vida, R. Waldemar Martins, 148, 02535- 000, São Paulo, SP, tel. (11) 6236-1425
BIBLIOGRAFIA
A Prática Reflexiva no Ofício de Professor: Profissionalização e Razão Pedagógica, Philippe Perrenoud, 232 págs., Ed. Artmed, tel. 0800-703-3444, 42 reais
Bullying e Desrespeito: Como Acabar com Essa Cultura na Escola, Marie-Nathalie Beaudoin e Maureen Taylor, 232 págs., Ed. Artmed, 48 reais
Colégio Renovação, R. Kalil Nader Habr, 137, 04154-030, São Paulo, SP, tel. (11) 5073-1455
EE Professor Magalhães Drummond, R. Fernando Alves, 260, 30516-080, Belo Horizonte, MG, tel. (31) 3312-1119
EMEF Paulo Nogueira Filho, R. Brazelisa Alves de Carvalho, 356, 2510- 030, São Paulo, SP, tel. (11) 3857-1892
Escola Projeto Vida, R. Waldemar Martins, 148, 02535- 000, São Paulo, SP, tel. (11) 6236-1425
BIBLIOGRAFIA
A Prática Reflexiva no Ofício de Professor: Profissionalização e Razão Pedagógica, Philippe Perrenoud, 232 págs., Ed. Artmed, tel. 0800-703-3444, 42 reais
Bullying e Desrespeito: Como Acabar com Essa Cultura na Escola, Marie-Nathalie Beaudoin e Maureen Taylor, 232 págs., Ed. Artmed, 48 reais
Sejamos todos Bem-vindos!
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